O senhor Ministro das Finanças demitiu-se alegando já não
ter credibilidade para continuar em funções depois de ter falhado a maior parte
das suas previsões.
Confesso que senti algum respeito pela coragem que o senhor Ministro
demonstrou ao chamar a si a responsabilidade por uma série de opções erradas que
outros apoiaram e que agora renegam. Foi demonstrativo de alguma verticalidade,
dignidade e inteireza de carácter. Quem assim procede tem a minha simpatia.
O senhor Ministro sentiu-se desapoiado para prosseguir num
caminho que se adivinha ainda mais difícil e conflituoso: o do Estado, ao
arrepio da Lei constitucional, contra os direitos sociais dos cidadãos, em nome
dos objectivos traçados pela sacrossanta Troika. O conflito com o Tribunal
Constitucional é apenas uma pontinha do iceberg de ilegalidades que a Troika propõe
ao Estado. E dá-se o caso de o Estado, ao agir ao arrepio da Lei, ter deixado
de ser, para os cidadãos, uma pessoa de bem, ou seja, perdeu a credibilidade.
O senhor Primeiro Ministro nomeou a senhora Secretária de
Estado do Tesouro para o lugar do Ministro das Finanças demissionário.
O senhor Ministro dos Negócios Estrangeiros demitiu-se por
discordar da nomeação da senhora Secretária de Estado para o lugar do senhor
Ministro das Finanças demissionário.
O senhor Primeiro Ministro assistiu à tomada de posse da
senhora Ministra das Finanças ao mesmo tempo que recebia a carta de demissão do
senhor Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O senhor Primeiro Ministro disse ao País que não se demite e
que ficou surpreendido com a resignação ao cargo do senhor Ministro dos
Negócios Estrangeiros.
Em causa está a credibilidade externa do País para sustentar
os momentos difíceis que vivemos. Logo agora que só falta mais um aninho de
sacrifícios para resgatarmos a nossa independência face aos credores. Logo agora
que já há tímidos sinais de crescimento económico. Logo agora…
A imprensa internacional deu eco dos acontecimentos
nacionais. As bolsas de valores ficaram nervosas. A cotação dos bancos baixou. Os
juros da dívida soberana aumentaram.
É tudo uma questão de credibilidade.
Milhares já emigraram porque não acreditam no que se passa
cá dentro. A UGT declarou guerra ao governo porque perdeu a confiança no
executivo. Os parceiros sociais deixaram a mesa das negociações porque não
existe uma verdadeira vontade de concertação. As pessoas estão revoltadas porque
já não dão crédito aos políticos. A miséria, o desemprego e o caos social
reflectem a mesma falta de credibilidade de que se queixou o senhor Ministro
das Finanças demissionário. Já ninguém dá crédito a ninguém (Nem os bancos!). É
a mais dramática de todas as misérias!
O problema é que mesmo que quiséssemos nós, o povo, não podemos
mandar uma carta de demissão ao senhor Primeiro Ministro resignando à nossa
função de meros contribuintes. Somos obrigados, não sei porque Lei, a carregar
o fardo das leviandades de todos esses decisores políticos incompetentes, de
Lisboa a Bruxelas, que desenharam o cenário de crise em que hoje todos
vivemos. É difícil aceitar que, depois de tamanhos dislates, eles ainda se
acreditem credíveis.
Entretanto, a tal Troika admite que errou em todas as
previsões. Essas previsões erradas afectaram de forma desastrosa a vida de
milhões de pessoas. Apesar disso, a Troika é credível. Mas é credível para
quem? Ninguém os pode demitir?
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