terça-feira, 2 de julho de 2013

Demita-se a credibilidade


O senhor Ministro das Finanças demitiu-se alegando já não ter credibilidade para continuar em funções depois de ter falhado a maior parte das suas previsões.

Confesso que senti algum respeito pela coragem que o senhor Ministro demonstrou ao chamar a si a responsabilidade por uma série de opções erradas que outros apoiaram e que agora renegam. Foi demonstrativo de alguma verticalidade, dignidade e inteireza de carácter. Quem assim procede tem a minha simpatia.

O senhor Ministro sentiu-se desapoiado para prosseguir num caminho que se adivinha ainda mais difícil e conflituoso: o do Estado, ao arrepio da Lei constitucional, contra os direitos sociais dos cidadãos, em nome dos objectivos traçados pela sacrossanta Troika. O conflito com o Tribunal Constitucional é apenas uma pontinha do iceberg de ilegalidades que a Troika propõe ao Estado. E dá-se o caso de o Estado, ao agir ao arrepio da Lei, ter deixado de ser, para os cidadãos, uma pessoa de bem, ou seja, perdeu a credibilidade.

O senhor Primeiro Ministro nomeou a senhora Secretária de Estado do Tesouro para o lugar do Ministro das Finanças demissionário.

O senhor Ministro dos Negócios Estrangeiros demitiu-se por discordar da nomeação da senhora Secretária de Estado para o lugar do senhor Ministro das Finanças demissionário.

O senhor Primeiro Ministro assistiu à tomada de posse da senhora Ministra das Finanças ao mesmo tempo que recebia a carta de demissão do senhor Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O senhor Primeiro Ministro disse ao País que não se demite e que ficou surpreendido com a resignação ao cargo do senhor Ministro dos Negócios Estrangeiros.

Em causa está a credibilidade externa do País para sustentar os momentos difíceis que vivemos. Logo agora que só falta mais um aninho de sacrifícios para resgatarmos a nossa independência face aos credores. Logo agora que já há tímidos sinais de crescimento económico. Logo agora…

A imprensa internacional deu eco dos acontecimentos nacionais. As bolsas de valores ficaram nervosas. A cotação dos bancos baixou. Os juros da dívida soberana aumentaram.

É tudo uma questão de credibilidade.

Milhares já emigraram porque não acreditam no que se passa cá dentro. A UGT declarou guerra ao governo porque perdeu a confiança no executivo. Os parceiros sociais deixaram a mesa das negociações porque não existe uma verdadeira vontade de concertação. As pessoas estão revoltadas porque já não dão crédito aos políticos. A miséria, o desemprego e o caos social reflectem a mesma falta de credibilidade de que se queixou o senhor Ministro das Finanças demissionário. Já ninguém dá crédito a ninguém (Nem os bancos!). É a mais dramática de todas as misérias!

O problema é que mesmo que quiséssemos nós, o povo, não podemos mandar uma carta de demissão ao senhor Primeiro Ministro resignando à nossa função de meros contribuintes. Somos obrigados, não sei porque Lei, a carregar o fardo das leviandades de todos esses decisores políticos incompetentes, de Lisboa a Bruxelas, que desenharam o cenário de crise em que hoje todos vivemos. É difícil aceitar que, depois de tamanhos dislates, eles ainda se acreditem credíveis.

Entretanto, a tal Troika admite que errou em todas as previsões. Essas previsões erradas afectaram de forma desastrosa a vida de milhões de pessoas. Apesar disso, a Troika é credível. Mas é credível para quem? Ninguém os pode demitir?

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